Com o avanço da seca grave e moderada, o Rio Grande do Norte permanece em estado de alerta diante de um período de estiagem em 2021. De acordo com a Empresa de Pesquisa Agropecuária (Emparn), o estado tem hoje 89 municípios em situação “muito seca”. Em janeiro, esse número era de 37 cidades, o que significa que somente neste ano, de janeiro para outubro, a seca grave evoluiu 140%.

O Monitor de Secas, da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), aponta que todo o estado está sob situação de seca fraca, moderada ou grave. Seridó, Agreste e grande parte do Oeste potiguar são as regiões mais afetadas pela insegurança hídrica. Já o Alto Oeste registra a menor intensidade de seca do RN.

Segundo Auricélio Costa, diretor-presidente do Instituto de Gestão das Águas do Estado (Igarn), a estiagem registrada neste ano, que ficou 35% abaixo da média de chuvas esperadas para o período, interrompeu um ritmo de recuperação, que teve início em 2018 e seguiu até o ano passado. Os bons invernos do triênio vieram após um dos maiores períodos de seca prolongada do Nordeste, entre 2012 e 2017, que atingiu em cheio o Rio Grande do Norte. Para se ter uma ideia, em 2017, a barragem Engenheiro Armando Ribeiro Gonçalves, a maior do estado, ficou abaixo dos 19% de sua capacidade total.

“Esse ano nos surpreendeu porque a curva de recuperação não continuou. Segundo a Emparn, nós tivemos 35% menos chuva, de forma geral, no entanto, essa redução não se refletiu na mesma ordem da redução de água nos grandes reservatórios. Isso é uma preocupação, estamos acompanhando o caso, juntamente à secretaria de Recursos Hídricos e Caern, que está fazendo baterias de poços para que a gente possa aliviar a situação e aguardar um inverno melhor. Estamos em estado de alerta, tomando uma série de providências para chegarmos ao próximo inverno ainda com água suficiente nos reservatórios”, comenta.

O gestor do Igarn reforça que ainda não há riscos de desabastecimento, tanto para o consumo humano quanto para a agricultura, enquanto o recurso natural for utilizado de forma “responsável e controlada”, mas afirma que uma política de racionamento poderá ser implementada em caso de novo inverno ruim, a exemplo do registrado neste ano. Costa também atribui influência das mudanças climáticas globais nos baixos volumes de chuva deste ano.

“Todo o planejamento é chegar no próximo inverno com água suficiente para o consumo humano e para a irrigação agropecuária, que tem sua importância na geração de empregos. Estamos atentos ao cenário. As mudanças climáticas estão aí, recentemente tivemos até tempestades de areia em São Paulo e Mato Grosso, isso é característico de deserto e chegou ao Brasil, fruto de mecanização excessiva do solo, desmatamento, uma série de questões ambientais, que nós avançamos além da conta e agora o planeta está cobrando sua fatura, e isso nos atinge também aqui”, complementa.

Queda no armazenamento
O baixo volume pluviométrico se reflete nas bacias hidrográficas potiguares. O volume total acumulado de água nos reservatórios é 16,34% menor em comparação com outubro do ano passado. A redução de 16,34% representa uma diminuição de 374,93 milhões m³ na “caixa d’água” do Estado, que tem a capacidade máxima de 4,42 bilhões m³. Das nove bacias, somente as duas menores estão com volume acumulado acima dos 50%: a Bacia Boqueirão (Lagoa de Boqueirão), com 83,67%; e a Bacia Doce (Lagoa de Extremoz), com 88,11%. O volume total de água armazenado atualmente é de 42,9% (1,89 bilhão m³) ante 50,7% em outubro de 2020 (2,27 bilhões m³).

A maior barragem do RN, com capacidade máxima de 2,37 bilhões m³, a Armando Ribeiro Gonçalves, que pertence à Bacia Piranhas/Assu, teve uma redução de 8,47% (-201 milhões m³) de suas reservas nos últimos doze meses e hoje está 50,69% cheia. Ainda na mesma bacia, o Açude Itans, em Caicó, também vem sofrendo os efeitos do mau inverno e registra atualmente 2,04% de volume, abaixo dos 10,41% observados há um ano.

O reservatório Santa Cruz do Trairi, da Bacia Trairi, também teve uma queda significativa nos índices, passando de um volume de 36,68% em outubro de 2020 para um acumulado de 9,86% neste mês, reflexo da seca crítica que atinge o município de Santa Cruz. A Lagoa do Bonfim, em Nísia Floresta, também apresentou queda no volume: de 53,44% há um ano para 47,79% hoje.

Por outro lado, reservatórios importantes do Alto Oeste potiguar tiveram incremento de água no período, devido à seca de menor intensidade na região. Na Bacia Apodi/Mossoró, a barragem Santa Cruz do Apodi, a segunda maior do Rio Grande do Norte, com capacidade máxima de 599 milhões m³, aumentou as reservas em 6,15% (+36,8 milhões m³ de água) no último ano. O reservatório de Pau dos Ferros também ganhou cerca de 7,02 milhões m³ de água no período, um aumento de 12,81%.

Governo vê situação de emergência
O Governo do Rio Grande do Norte considera o cenário como “situação de emergência” e prepara uma série de medidas de mitigação dos efeitos da seca, prevendo um inverno similar ao deste ano. “Estamos com as reservas do estado em cerca de 42%, num período já considerado muito crítico porque o inverno, a princípio, seria bom, mas foi pontual. Foi um inverno atípico e há uma previsão, até foi repassado para mim, de que o inverno do próximo ano não será tão generoso quanto o desse ano, que já não foi generoso. Vai ser um inverno igual ou menos. Então, o Governo do Estado está com toda a preocupação na infraestrutura hídrica, acelerando obras e o processo de entrega de poços”, ressalta João Maria Cavalcanti, titular da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh).

O Executivo estadual conta também com a liberação de recursos para a conclusão das obras da Barragem de Oiticica, em Jucurutu, que quando concluída, atenderá 330 mil potiguares dos municípios de Caicó, Timbaúba dos Batistas, São Fernando, Jardins de Piranhas, Cruzeta, São José do Seridó, São José do Sabugi, além da própria Jucurutu. A barragem está com 94% das obras executadas e deve estar totalmente concluída até o primeiro semestre de 2022.

Segundo João Maria Cavalcanti, cerca de 400 poços já foram perfurados e estão em fase de entrega no Seridó do RN. A expectativa é de que, ao todo, 635 poços sejam abertos até o ano que vem em todo o estado, com o investimento de R$ 15 milhões oriundos de recursos estaduais e emendas parlamentares . A iniciativa integra o programa RN+Água, criado para ampliar o acesso ao recurso natural.

“Estamos trabalhamos com as equipes a todo vapor na entrega de poços instalados já para o uso das comunidades no Seridó. Oiticica está no processo de conclusão, a previsão que tinha para encerrar agora no final do ano foi colocada para até o meio do ano que vem e a gente conta com o governo federal para isso. Tem projetos também de construção de agrovilas, dentro do projeto da barragem de Oiticica para incentivo da agricultura familiar. Estamos constantemente atentos e discutindo a questão hídrica do estado. Está havendo toda uma preparação para enfrentamento da seca nos próximos anos”, acrescenta.

Fonte: Tribuna do Norte
Foto: Junior Santos/Arquivo TN