As recentes apreensões de drogas feitas no Porto de Natal vêm preocupando produtores de frutas do Rio Grande do Norte. É o que afirma Fábio Queiroga, presidente do Comitê Executivo de Fruticultura (Coex/RN). Ao todo, em 2021, ações da Polícia Federal e da Receita Federal interromperam o embarque de 2,4 toneladas de cocaína em navios com destino à Europa. Fábio Queiroga diz que a tendência é que as empresas passem a ter seus próprios veículos para evitar uma possível contaminação das cargas e não depender de transportadoras terceirizadas. “Tudo isso está sendo feito para que o trajeto não tenha nenhum tipo de interferência até o Porto”, afirma.

Segundo a Coex, as empresas tomam uma série de medidas para coibir a ação de traficantes. “Colocamos câmeras para acompanhar o processo de carregamento para provar que ele é idôneo na origem, na fazenda. Colocamos lacres para evitar clonagens”, comenta.

As investidas dos traficantes internacionais acabam prejudicando a imagem do setor de produção e exportação de frutas no mercado, segundo Queiroga.

“Estamos focados na produção, exportação e comercialização das nossas frutas, então quando acontece algo dessa natureza, é mais um problema que temos que resolver porque os traficantes conseguem interceptar nossas cargas. As frutas são transportadas por companhias terceirizadas, então, de alguma forma, eles conseguem retirar as frutas das caixas e colocar as drogas. Isso é muito ruim porque uma notícia dessas é divulgada em todo o planeta, não como a fruta de Mossoró, mas como a fruta do Brasil, da América do Sul, o que causa um prejuízo na nossa imagem”, comenta o presidente do Coex.

A última apreensão de drogas no porto natalense ocorreu na segunda-feira (29). Uma carga de 1.600 quilos de cocaína foi encontrada dentro de um contêiner misturada em meio a caixas de gengibre. O destino da droga era o porto de Roterdã, na Holanda. De acordo com informações da Receita Federal, a apreensão causou um prejuízo estimado ao narcotráfico de R$ 360 milhões. Foi a segunda vez que os órgãos federais encontram cocaína no Porto de Natal, em um intervalo de dez dias. No último dia 19, a Receita e a PF apreenderam uma carga de 265 quilos de cocaína misturada em meio a uma carga de manga que iria para a Europa.

Fatores como a localização privilegiada e o protagonismo do Rio Grande do Norte na exportação de frutas transformaram o terminal portuário natalense em um ponto de embarque do tráfico internacional de drogas, segundo investigações da Polícia Federal. O estado é responsável por 40% das frutas que são mandadas para fora e para 2022, a expectativa é de que o setor movimente R$ 1 bilhão.

Para a Companhia Docas Do Rio Grande do Norte (Codern), autoridade portuária responsável pelo Porto de Natal, as apreensões devem ser vistas como algo positivo. “Isso mostra que as medidas de segurança da Codern, da Polícia Federal e da Receita Federal estão eficazes. E outra coisa, a questão do tráfico de drogas é um problema de Segurança Pública”, disse a instituição em nota enviada à reportagem da TRIBUNA DO NORTE.

Ainda segundo a Codern, desde outubro do ano passado, o escâner de contêineres está em funcionamento no Porto de Natal. O equipamento foi instalado após negociações com agentes públicos e a iniciativa própria do armador CMA/ CGM, da empresa operadora portuária, Progeco, e fruticultores do Estado. O custo mensal varia entre R$ 350 mil e R$ 400 mil. O contrato inicial iria até setembro deste ano, mas, segundo a Codern, foi renovado.

“Uma série de medidas vem sendo tomadas pela Codern, Polícia Federal e Receita Federal. A começar pela instalação do escâner de contêineres, com apoio da empresa privada que realiza a operação portuária, além do aumento de câmeras de segurança, melhora de toda a infraestrutura de segurança e outras que não podem ser ditas por questão de sigilo”, complementa a nota da companhia.

Sobre as ações para coibir o tráfico internacional de drogas, a Receita Federal informa que conta com o apoio da Codern e da Polícia Federal para aumentar as ações de vigilância no Porto. “A Receita Federal vem intensificando as fiscalizações para combater tais ilícitos, com uso cada vez mais intenso de tecnologia, inclusive escâner, e análise de risco e inteligência. Infelizmente, Natal passou a se constituir de uma rota muito usada pelos traficantes, o que leva a um aumento das ocorrências”, destacou a instituição federal.

Fábio Queiroga, do Comitê Executivo de Fruticultura do RN, diz ainda que as apreensões feitas em solo potiguar evitaram que o pior acontecesse. “Ainda bem que as inspeções existem e que a Receita e a PF estão atentas porque o pior dos cenários seria essa droga chegar na Europa. Nesse caso, a gente poderia até ter embargo nos países europeus, como já aconteceu com países da América do Sul que foram impedidos de exportar produtos porque a droga estava chegando no país destino”, pontua.

Quadrilha internacional tem usado o Porto de Natal
Há quase três anos, o Porto de Natal vem sendo utilizado para o escoamento da droga à Europa, por um ou mais grupos criminosos. Parte ou a totalidade dessa atividade é chefiada pelo “Pablo Escobar Brasileiro”, como é conhecido Sérgio Roberto Carvalho, um dos maiores narcotraficantes do mundo, segundo a Polícia Federal.

O Major Carvalho, 63, como é conhecido, atualmente está desaparecido e procurado pela Interpol. As últimas informações são de que ele tenha fugido para a Ucrânia numa aeronave própria. Segundo as investigações, ele utiliza de um grandioso esquema em portos do Brasil, incluindo o de Natal, para transportar drogas à Europa. A Justiça estima que o Major Carvalho exportou 45 toneladas de cocaína, o que resulta em R$ 2 bilhões em drogas.

O papel do Rio Grande do Norte no esquema internacional comandado pelo Major Carvalho ocorre com métodos e técnicas para driblar a Receita e Polícia Federal. O principal método é o Rip On/Rip Off, que consiste na quebra do lacre do conteiner, inserção da droga (Rip On) e colocação de outro lacre, sem conhecimento do exportador ou importador da carga lícita. Na descarga no destino, há o movimento inverso e o conteiner é reaberto para retirada da droga (Rip Off).

Como o Porto de Natal exporta apenas frutas e pescados, a droga é ocultada nas cargas refrigeradas. As investigações apontam que nesses casos, é necessário o aluguel de galpões para esconder a droga e preparar a ocultação no conteiner. Segundo a denúncia, o aluguel desses galpões e barracões (com compartimentos ocultos e subterrâneos) são feitos mediante documentos falsos.

O auditor fiscal Maurício Santos aponta que a localização do Porto e a proximidade de Natal com a Europa são fatores que explicam a capital estar na rota do tráfico. “Natal é o último Porto antes do navio ir para Europa. O navio passa pouco tempo aqui, média de três dias”, acrescenta.

Além disso, até outubro do ano passado, o Porto de Natal operava sem scanner de conteiners, situação que só mudou após uma empresa que atua no local bancar a instalação do equipamento.

Grandes apreensões começaram em 2018
A primeira apreensão da história do Porto, aberto em 1932, aconteceu em fevereiro de 2019, com 1.275 quilos de cocaína apreendidos que iriam em direção à Holanda. Desde a primeira apreensão, pelo menos 17.568 quilos de cocaína foram apreendidos no Porto de Natal, sendo 6.190 deles interceptados na capital potiguar. No boletim da Receita Federal constam ainda a apreensão de 1.400 quilos pela Polícia Federal em novembro de 2018, num galpão de Parnamirim, em que há a suspeita de que seriam exportados via Porto de Natal.

No ano passado, a Polícia Federal prendeu três pessoas em flagrante no Porto de Natal com 238,9 quilos de cocaína. De acordo com a PF, a droga seria enxertada em um contêiner que seguiria para a Europa. A ação aconteceu em conjunto com a Receita Federal. Os suspeitos eram paranaenses, de 21, 34 e 47 anos. Segundo a PF, dois deles tinham antecedentes criminais e um era ex-policial militar do Paraná.

Essa apreensão, inclusive, chamou ainda mais a atenção da Polícia Federal, que intensificou as investigações e passou a investigar funcionários com livre circulação no terminal portuário ligados ao esquema do tráfico de drogas. Segundo a PF, o caminhão foi seguido por policiais federais de um galpão localizado em Emaús, na Grande Natal, até o terminal na Ribeira. Quatro pessoas sem relação com o Porto foram presas em flagrante. Os policiais federais encontraram lacres de contêineres com esses suspeitos presos.

Fonte: Tribuna do Norte
Foto: Alex Régis