A falta de regulamentação e definição de regras sobre os usos e atribuições em Zonas de Proteção Ambiental (ZPAs) de Natal resultou em danos ambientais nesses espaços nos últimos 14 anos. Criadas em 2007 no Plano Diretor da época, esses trechos nunca foram regulamentados e segundo estimativas da Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (Semurb), a perda de vegetação varia de 10 a 15%.

Essas estimativas foram feitas ao longo dos últimos anos com base nas denúncias de ocupações irregulares, invasões, usos proibidos, e análises de imagens de satélite e visitas feitas em campo pela equipe técnica da Semurb. Apesar dos números estimados, não há um relatório ou estudo técnico-científico detalhando as perdas vegetais em cada uma das cinco ZPAs que aguardam regulamentação.

“São dados de processos administrativos de fiscalização, Corpo de Bombeiros, que nos dão essa margem de 10 a 15% de áreas perdidas ao longo desses 14 anos e uma das razões é a falta de controle e licenciamento nessas áreas, porque o PDN concluiu, de forma equivocada, que para preservar, era pra proibir tudo enquanto não fossem regulamentadas”, explica o secretário de Urbanismo e Meio Ambiente de Natal, Thiago Mesquita. “A falta de controle e licenciamento, da presença e ocupação humana de forma ordenada nessas ZPAs contribuiu para que essas áreas tivessem perdas da cobertura vegetal”, diz.

Segundo o secretário Thiago Nunes Mesquita, dessas cinco ZPAs não regulamentadas, duas delas apresentam situações mais críticas: a 8 e a 9, que correspondem ao estuário do Rio Potengi e manguezal, e o complexo de lagoas e dunas ao longo do Rio Doce, respectivamente.

“São áreas que possuem maior predominância de particulares, imóveis com tamanho maior de extensão e são áreas mais afastadas dos centros urbanos”, diz.

As cinco ZPAs não regulamentadas fazem parte de um grupo que inclui outras cinco zonas, estas que foram regularizadas ao longo dos últimos 14 anos. Juntas, as ZPAs 6, 7, 8, 9, 10 somam 3.428,83 hectáres, o que corresponde a 20% do território de Natal, que é de 16.853,24 hectáres. Um cálculo feito pela TRIBUNA DO NORTE, levando em consideração as estimativas percentuais da Semurb, mostra que a perda de vegetação pode ter sido de até 514,32 hectáres nas cinco áreas.

“São perdas vegetais, de uso e ocupação de solo, drenagem de rio, desvios, assoreamento desse rio, a perda da biodiversidade, organismos vivos. É uma perda de serviços ambientais”, complementa Mesquita.

Ainda segundo o secretário Thiago Mesquita, a regulamentação das ZPAs pode criar subzonas nesses espaços, que seriam o “uso restrito”, “conservação” e “preservação”.

“No uso restrito você pode construir, mas com restrições mais rígidas do que nas áreas mais adensadas, por exemplo; uma de conservação, que funciona como uma zona de amortecimento, para a subzona de preservação, que essa é que por ser área de preservação permanente não se pode ter alterações do uso do solo”, complementa.

Regulamentação
De acordo com a Semurb, a expectativa é que a regulamentação dessas cinco áreas aconteça durante as discussões do Plano Diretor de Natal (PDN), que chegou à Câmara Municipal no final de setembro. O secretário Thiago Mesquita acredita numa autoregulamentação, que teria que surgir dentro de emendas parlamentares nas discussões finais na Câmara, o que ainda não aconteceu.

“Se tem dois caminhos para definir essas prescrições urbanísticas das ZPAs: a lei específica, que passa pelos conselhos e é encaminhada à Câmara, e também pode se utilizar o PDN dentro do próprio plano. Essas propostas já existem desde 2010. Estamos em 2021. Tivemos estudos, passaram por audiências públicas e conselhos e estão no Concidade. Não há mais razoabilidade ficar aguardando regulamentar tendo uma discussão e uma prerrogativa legal. É o que vai acontecer”, garante.

A proposta da Prefeitura do Natal enviada à Câmara define que enquanto não houver a regulamentação ficam instituídas as regras contidas nos processos em tramitação no Conselho da Cidade (Concidade), que discute a política municipal de planejamento urbano, ou em suas câmaras técnicas.

Com isso, seria permitido que as regras estabelecidas nos processos sejam implementadas. Elas podem determinar, por exemplo, o que é permitido e o que não é permitido construir dentro das ZPAs.

Caso isso não se confirme, as Zonas de Proteção Ambiental precisarão passar por projetos de lei, individualmente, para serem devidamente regulamentadas.

“Se não tiver emendas encartadas nessa fase, aí teríamos um prazo para essa regulamentação. Em 2007 foi de dois anos, mas isso não aconteceu. Essa é uma boa oportunidade de se definir as regras”, explica o secretário Thiago Mesquita.

Áreas não são utilizadas sem regulamentação
Enquanto não são regulamentadas, as Zonas de Proteção Ambiental (ZPAs) não podem ser utilizadas, isto é, não se pode construir nenhum tipo de edificação nesses espaços, que segundo a prefeitura, em sua maioria são privados.

A presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RN (Crea-RN), Ana Adalgisa Dias, defende a regulamentação e a definição de regras para uso desses espaços. Para ela, a não regularização favorece a invasões clandestinas e ocupações irregulares.

“A pessoa, enquanto proprietária de uma área dentro de uma ZPA, não pode fazer uma melhoria, construir um muro, transformar num parque, isso porque não está dito qual é a regra que diga o que se pode fazer nessa área. Isso favorece invasões, porque invasores não cumprem regras. Vemos cada vez mais proprietários com áreas invadidas e as pessoas tendo que usar seus recursos para tirar esses invasores ou deixá-los lá. E o que era para ser uma área protegida, como diz o nome, vai se tornando uma área degradada”, cita Ana Adalgisa Dias.

A professora do Departamento de Políticas Públicas da UFRN, Zoraide Souza Pessoa, também defende a regulamentação, mas possui pensamento diferente. Na avaliação dela, a cidade precisa “se planejar diante do contexto de mudanças climáticas.

Ainda segundo a avaliação da professora Zoraide Pessoa, a regulamentação “precisa observar como será essa ocupação, o controle, para que não ocorra, em vez de um processo ordenado, você amplie essa desordenação, tornando essas zonas ainda mais vulneráveis”. Para ela, as ZPAs não têm estrutura para ocupações.

“Se essas áreas forem regulamentadas e forem voltadas apenas para uso ocupacional e imobiliário, vamos transformar Natal numa cidade mais vulnerável nas questões ambientais e climáticas do que ela já é. Todas essas cinco áreas não regulamentadas, elas são, na verdade, estoques ambientais de interesse essencial para manutenção da qualidade de vida”, disse. “Essas áreas não têm espaço para construção, não tem abertura, porque são dentro de sistemas ecológicos”, complementa.

O secretário de Urbanismo e Meio Ambiente de Natal, Thiago Mesquita, discorda desse posicionamento. Para ele, com exceção da ZPA 6 (Morro do Careca e dunas associadas), as outras ZPAs possuem condições de definições de construções nesses espaços. “Nas outras temos subzonas de uso restrito que dá para ocupar com racionalidade”, cita Mesquita.

“Qualquer atividade antrópica vai ter impactos ambientais. O que precisamos fazer é: colocando na balança os impactos positivos e negativos, o custo benefício vale a pena? Sim, quando se regulamenta, os seres humanos precisam de moradia, mobilidade, esgotamento, senão não vamos sobreviver. Tem que se ter um equilíbrio de se relacionar com os recursos naturais de forma sustentável”, cita.

Fonte: Tribuna do Norte
Foto: Alex Régis