O Programa Estadual de Sementes Crioulas insere o Governo do RN na luta camponesa por uma terra livre de transgenia, cujo desafio ainda é maior para quem planta milho.

Sementes naturalmente livres de transgenia, as variedades Ibra, Pontinha, Posto rico, Metro e Asteca são alguns tipos de milho crioulo cultivados nos territórios potiguares, razão pelo qual foram inseridos no Programa Estadual de Sementes Crioulas do Rio Grande do Norte. A ação é executada pelo governo estadual através da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural e da Agricultura Familiar (Sedraf) e da Emater-RN (Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural), em parceria com a Articulação do Semiárido (ASA Potiguar), União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (Uern) e Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa).

A entrega das sementes crioulas da Safra 2021/22 foi iniciada em meados de dezembro de 2021, garantindo que os agricultores e as agricultoras familiares do estado tenham como se planejar com relação ao período adequado para o plantio. A aquisição e a distribuição de sementes crioulas – implementadas pelo Governo do Estado na gestão da professora Fátima Bezerra – estão amparadas pela Lei Estadual Nº 10.852/21, de autoria da deputada estadual Isolda Dantas.

“O amparo legal foi um passo importante para consolidar o nosso programa como o maior do Brasil. Estamos causando uma revolução nas comunidades tradicionais. Em seu terceiro ano de execução, o programa está se consolidando como uma política de estado, para a qual contamos com uma lei avançada, com dotação orçamentária prevista no orçamento anual do estado”, contextualizou o titular da pasta, Alexandre Lima.

Nesta safra atual, o governo estadual investiu R$ 900 mil, para aquisição e distribuição de 54 toneladas de sementes de milho, feijão, gergelim e sorgo. Desse total, 2,8 toneladas correspondem às variedades citadas de milho, devidamente analisadas em rigorosos testes de laboratório, nos quais foram aferidos o alto grau de pureza e o poder de germinação. Os testes estão sendo realizados através de convênio firmado com a Fundação Guimarães Duque (de Apoio à Ufersa), que tem viabilizado a análise da qualidade das sementes no Laboratório de Análises de Sementes (LAS), da própria universidade.

Segundo a agricultora Neneide Lima, que representa a Unicafes (União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária), uma das entidades parceiras da Sedraf na articulação para aquisição das sementes, o mais grave dos problemas enfrentados pelos guardiões e as guardiãs das sementes é afastar do campo todas as possibilidade de contaminação cruzada com o milho transgênico.

“O maior desafio é fazer com que os agricultores e as agricultoras, que estão formando os campos de multiplicação, produzam essa semente indiferentemente do tempo de outras pessoas que plantam milho na região, porque quando o milho já está ‘cacheando’, ele já está colocando pendão, é quando ocorre o risco de contaminação. O complicado é que a gente não tem domínio total do território e nem das sementes que passam por aquele território”, explicou Neneide. No ato de entregas de sementes, realizado na cidade de Mossoró no dia 14/12/21, ela expôs a luta camponesa “por um território livre de transgenia”.

SEMENTES DA TRADIÇÃO – Hoje em dia as sementes crioulas vêm tendo destaque no mundo todo pela sua importância no sentido de manter as tradições dos povos que as cultivam, como também pelo aspecto da soberania alimentar. Segundo o coordenador nacional da ASA, Antônio Barbosa, a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) tem feito um importante trabalho na perspectiva de como preservar e proteger as sementes nos territórios, em nível mundial. “Principalmente nessa perspectiva de sementes geneticamente modificadas, que trazem um impacto na agricultura e na vida dos agricultores de forma muito forte. E quando a gente olha para as sementes, quando a gente olha para as espécies que mais têm sofrido, é notável que a semente que mais sofre é o milho. O milho crioulo”, enfatizou.

A ASA, segundo ele, tem feito vários testes no semiárido brasileiro sobre transgenia, os quais apontam o crescimento da contaminação desse material, fato que é muito preocupante, porque se trata de materiais que estão com as famílias há mais de 100, 200 anos ou até mais tempo. “Ainda não temos estudos suficientes para sabermos se teremos como resgatar o material contaminado. Existe sim, essa possibilidade, mas ela é muito pequena. Hoje, uma das principais estratégias, no mundo todo no campo da agricultura familiar, das comunidades tradicionais, dos povos indígenas, tem sido justamente a construção de áreas livre de transgênicos”, pontuou Barbosa, que atesta como de extrema importância o programa potiguar, visto que atua diretamente para ampliar o território livre de transgenia.

Com a criação do Programa Estadual das Sementes Crioulas, o Governo do Rio Grande do Norte demonstra estar alinhado aos anseios dos movimentos sociais do campo, que reivindicavam a distribuição das sementes tradicionais, ao mesmo tempo em que cumpre os objetivos de sustentabilidade, estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).

TESTE DE TRANSGENIA – De todos os desafios, o mais complexo e preocupante é a contaminação de variedades crioulas de milho por transgênicos no semiárido. Todas as sementes passam por testes físicos e as variedades de milho também passam pelo teste de transgenia. Em 2021, foram feito testes rápidos com tira imunocromatográfica, sendo analisadas 55 amostras de milhos das variedades: Asteca, Jabatão amarelo e vermelho, Posto rico, Pontinha, Ibra, Metro, Campeão, Grão de ouro, Dentado, Moita, Sete palha, Verdadeiro e Zebu.

Do total de amostras analisadas, 14 amostras apresentaram resultados satisfatórios, livres de transgênicos, ou seja, 25%. Porém, 75% das amostras apresentaram contaminação por um ou mais eventos de transgenia. O avanço da contaminação de variedades crioulas de milho pelos transgênicos afetará de forma significativa a diversificação de variedades crioulas de milho e consequentemente a diminuição da diversificação de alimentos, ameaçando diretamente a soberania e segurança alimentar dos povos do semiárido.

POLÍTICA PÚBLICA – O Programa Estadual de Sementes Crioulas no Rio Grande do Norte se caracteriza principalmente pelo seu pioneirismo enquanto política pública. Começou a ser executado em 2019 e no primeiro ano foram adquiridas 51 toneladas de sementes diretamente da agricultura familiar. Através do estímulo à utilização de sementes localmente adaptadas à realidade ambiental e social da agricultura familiar potiguar, o programa tem como objetivo garantir a preservação da biodiversidade das sementes crioulas no semiárido, a partir da distribuição para famílias rurais, proporcionando a autonomia dos agricultores, a produção de alimentos saudáveis, a promoção da segurança alimentar e nutricional, bem como a inclusão e geração de renda.

Em novembro de 2020, a Sedraf lançou o edital 02/2020 que estabeleceu a compra e distribuição de 96 toneladas de sementes crioulas, evoluindo em quantidade (51 para 96 toneladas) e número de variedades (subiu de 11 para 28), o que demonstra o interesse e compromisso do Governo do RN em ampliar a ação territorial e a quantidade de famílias a serem atendidas, além do potencial de diversidade de variedades crioulas produzidas nos territórios.

Fonte: Governo do RN/SEDRAF
Fotos: Elisa Elsie/Assecom-RN e Klediógenes Nóbrega/Assecom-Emater-RN.