Policiais civis e delegados do Rio Grande do Norte decidiram que vão continuar a paralisação iniciada na última segunda-feira. Em várias reuniões ao longo desta terça- (08), não houve acordo  para o fim da greve entre o Governo do Estado, membros do judiciário e entidades sindicais, que temem suspensão do pagamento do Adicional por Tempo de Serviço (ADTS). O Estado garante que não haverá perdas salariais e informou que vai esperar o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que julgará se o ADTS é um benefício legal. 

“No ano passado, as entidades representativas pediram ao TJRN e ao MP uma suspensão da ação. O pedido foi acatado e um prazo de 180 dias foi dado para que pudéssemos negociar com o Governo do Estado uma solução”, explica Edilza Faustino, presidente do Sindicato dos Policiais Civis do RN (Sinpol-RN). 
O julgamento da causa acontece desde 2016. Há seis meses, uma audiência entre as partes deliberou que o Estado teria 180 dias para encontrar uma solução para o ADTS com as entidades representativas dos policiais. Esse prazo se encerra no fim de fevereiro, segundo o Tribunal de Justiça do RN.
Ainda segundo o vice-governador Antenor Roberto, ficou acordado entre as partes que, o autor da ação, o Ministério Público do RN, dará um parecer para modular os efeitos da decisão caso o TJRN determine a inconstitucionalidade da matéria. Na prática, segundo Antenor, a modulação seria uma transição de ADTS para vencimentos, o que não acarretaria em perdas salariais.
“O Governo vai ter que esperar essa decisão judicial porque ela vai ser a matriz para dar segurança jurídica. Imagine se a gente manda uma lei regulamentando o sistema de subsídio e o desembargador decide diferente, até pela constitucionalidade? Temos que ter a paciência de esperar essa decisão judicial. Para quê a greve? Não existe perigo em eles terem redução salarial, porque o próprio autor da ação, o MP, nos garantiu que a ideia não é reduzir o salário, mas sim levar os policiais a ingressar em regime de subsídio” aponta o vice-governador. 

A presidente do Sinpol-RN, Edilza Faustino, questiona a medida. “O fato novo hoje é que o Governo teria conversado com o MP e traria uma uma garantia de não redução. Mas que garantia é essa? Não existe nada escrito em lugar nenhum? Porque o Governo aposta na decisão do judiciário”, diz. “O Governo quer que os policiais civis paguem pra ver uma decisão judicial totalmente imprevisível, que poderá sim resultar em perda do ADTS e em grandes prejuízos financeiros. Então, a categoria decidiu manter a paralisação e continuar cobrando a negociação de uma proposta que venha a evitar qualquer retirada de direito”, completa.
Paralisação prejudica atendimento em Natal
Quem procurou atendimento nas unidades da Polícia Civil do Rio Grande do Norte na terça-feira (8) encontrou delegacias de portas fechadas. Foi o caso do empresário Moacir Leite, que teve o carro roubado na noite de segunda-feira (7) em Natal, e encontrou dificuldades para registrar um boletim de ocorrência. Ele chegou a procurar a Delegacia Especializada de Defesa e Propriedade de Veículos e Cargas (Deprov), mas foi orientado a buscar ajuda na Academia de Polícia Militar, localizada na Avenida Almirante Alexandrino de Alencar, por causa da greve dos policiais civis.
“Fui encaminhado para cá depois de ter passado na Deprov, mas aqui não tem escrivão ainda. Estão esperando ele chegar e mandaram a gente ficar aguardando aqui. Estou aqui esperando e espero que possa ser resolvido esse problema, que aconteceu ontem [segunda-feira] à noite. Eram 20h, quando estava chegando em casa fui abordado por dois sujeitos com arma, que mandaram descer do carro e pediram o celular”, conta o empresário, que foi assaltado no bairro de Barro Vermelho, zona Leste da capital.
Além de Moacir Leite, outras seis pessoas aguardavam a chegada de um escrivão para serem atendidas no anexo improvisado da Polícia Civil no Quartel da Polícia Militar. “Estou há mais de uma hora aqui e sem perspectiva de ser atendida. Fui na Delegacia de Plantão da Zona Norte e só tinha um policial lá porque o prédio não podia ficar abandonado. Agora a gente fica aqui aguardando sem saber de fato se nosso problema será resolvido”, disse uma mulher, que se deslocou da zona Norte da cidade para registrar um boletim de ocorrência por problemas familiares.
A sala da Polícia Civil nas instalações da PM foi uma solução paliativa adotada pela corporação para dar vazão aos registros de ocorrências, que foram paralisados com a greve da categoria. No interior, as ocorrências estão sendo encaminhadas para as delegacias regionais. Todo o serviço prestado pelas delegacias da Polícia Civil na Região Metropolitana de Natal está concentrada na sala improvisada, que conta com um efetivo de seis policiais para dar conta do suporte à população, conforme constatou a reportagem da TRIBUNA DO NORTE, que visitou a unidade na manhã de ontem (8). 
A sala, que também abrigava momentaneamente três detentos, estava sob a supervisão da delegada Maria do Carmo, que é do quadro administrativo da Delegacia Geral da Polícia Civil (Degepol). “Estamos fazendo os flagrantes, as comunicações, registros de boletins de ocorrência. Todo procedimento de urgência está sendo feito aqui. Está tudo concentrado aqui. O que está chegando nós estamos resolvendo. Começamos agora para terminar as ocorrências de ontem [segunda] ainda para começar o plantão do dia de hoje [terça]. Esperamos que haja um acordo o mais breve possível para encerrar a paralisação”, explica a agente da Civil.
Segundo a assessoria de comunicação da Polícia Civil, há uma alternativa para o registro de boletins de ocorrência nas hipóteses em que o fato não configura crime, a exemplo da “perda ou extravio de documento, ou objeto” e da “comunicação de fato”, que devem ser feitos por meio da Delegacia Virtual, que está disponível 24h, no site da instituição. 
Também é facultado e recomendado ao cidadão o registro na Delegacia Virtual das seguintes ocorrências: ameaça, furto e roubo (exceto veículos); estelionato, injúria, difamação, calúnia; acidente de trânsito sem vítima; dano, vias de fato, perturbação do sossego; desaparecimento de pessoa, constrangimento ilegal; maus-tratos contra animais; localização de pessoa desaparecida e dano causado por acidentes naturais. Após o registro, e aceitação do Boletim de Ocorrência, o cidadão receberá o arquivo do documento em seu e-mail.
Mobilização
A mobilização dos agentes, delegados e escrivães da Polícia Civil entrou no segundo dia na terça-feira (8). A categoria decidiu cruzar os braços em protesto contra uma ação do Ministério Público, que pede a suspensão do pagamento do Adicional por Tempo de Serviço (ADTS). Ainda na terça, os policiais ficaram concentrados na frente da Governadoria pedindo uma reunião com a governadora Fátima Bezerra. No dia anterior, na segunda, os trabalhadores já haviam participado de outra manifestação, na Central de Flagrantes, onde fizeram uma caminhada pelo bairro de Cidade da Esperança.
Os policiais civis pedem que o Governo do Rio Grande do Norte interceda na ação do Ministério Público e evite que o ADTS seja suspenso. No entendimento do MP, o pagamento do adicional vai de encontro ao que estabelece a Constituição, que prevê que o pagamento dos servidores seja feito “exclusivamente por subsídio fixado em parcela única remuneratória”.
O adicional por tempo de serviço é um benefício anual que incrementa 1% do salário nos vencimentos do servidor para cada ano de serviço. Portanto, um agente com 10 anos de serviço, por exemplo, perderia 10% de salário referente ao ADTS. Os agentes pedem que o Governo encontre uma solução para atender o pleito do MP, a partir da formulação de um projeto de lei para dar segurança jurídica à continuidade de pagamento do ADTS.

Fonte: Tribuna do Norte

Foto: Magnus Nascimento