Brasília e São Paulo (AE) – O cenário da disputa presidencial foi intensamente movimentado nessa quinta-feira (31) com a desistência de Sérgio Moro e uma manobra do ex-governador de São Paulo João Doria para garantir o que chamou de “apoio explícito” do PSDB à sua pré-candidatura. No dia marcado para sua renúncia ao governo do Estado, Doria surpreendeu aliados ao informar que permaneceria no Palácio dos Bandeirantes. Ele retomou o projeto presidencial horas depois, após o presidente nacional da legenda, Bruno Araújo, enviar uma carta aos principais líderes do partido garantindo apoio à sua candidatura. Moro, por sua vez, trocou o Podemos pelo União Brasil, abrindo mão, “neste momento”, de disputar o Palácio do Planalto.

A saída de Moro animou líderes políticos envolvidos em uma articulação pela concentração da terceira via. Sem apoio no Podemos, o ex-juiz da Operação Lava Jato foi recebido no União Brasil com reticências. A ala ligada ao ex-prefeito de Salvador ACM Neto condicionou o ingresso de Moro ao partido ao abandono da pretensão de disputar o governo federal. O ex-juiz mudou o domicílio eleitoral do Paraná para São Paulo e deverá ser candidato a deputado federal.
Numericamente, o ex-juiz é quem aparece nas pesquisas em melhor posição entre os pré-candidatos do centro. No mais recente levantamento do Datafolha, Moro somou 8% das intenções e voto nos cenários pesquisados, atrás do ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva (43%) e do presidente Jair Bolsonaro (26%), do PL. No mesmo levantamento, Doria registrou 2%.
No caso do tucano, a avaliação entre adversários e até aliados é de que ele esgarçou ainda mais a relação com a direção do PSDB, aprofundou a divisão interna e continuará sofrendo forte resistência na legenda. Falando já como ex-governador após seu discurso de despedida, Doria disse que as notícias sobre sua desistência pela Presidência foram uma “estratégia política”. Segundo ele, houve um planejamento prévio para que Araújo tivesse de se manifestar publicamente em apoio a seu nome.
Mas dois fatores foram determinantes para a arriscada jogada política do tucano. A primeira foi a desconfiança em relação a quadros que deveriam estar na linha de frente de sua pré-campanha: além de Araújo, o então vice-governador (e agora governador) Rodrigo Garcia, que foi escolhido em prévias o pré-candidato do PSDB ao governo paulista.
Segundo um aliado próximo a Doria, Garcia despertou desconfiança ao manter pontes com a ala tucana alinhada ao gaúcho Eduardo Leite – que perdeu as prévias nacionais, mas se mantém como opção no partido para a disputa ao Planalto. Nessa quinta, Leite formalizou a renúncia ao governo do Rio Grande do Sul sem abandonar o discurso de pré-candidato. “É cedo para dizer o que as próximas semanas me reservam”, destacou. “Mas posso dizer que esse percurso vai ser coletivo.”
Havia também o temor no Palácio dos Bandeirantes de que Garcia abandonasse Doria assim que assumisse o cargo. Sem a retaguarda da máquina paulista, do partido e do seu sucessor, o presidenciável ficaria mais vulnerável. Em relação a Araújo, Doria, que nunca confiou no dirigente, percebeu que sua pré-candidatura presidencial seria sufocada financeira e politicamente. Um sinal da falta de recursos foi a saída do marqueteiro Guilherme Raffo da pré-campanha. Doria tem minoria na executiva nacional do PSDB, que conta com 32 integrantes.
Para Felipe d’Avila, pré-candidato do Novo ao Palácio do Planalto, com a renúncia de Moro e a candidatura de Doria, “a terceira via ainda terá de ser depurada antes de ser unida”. “A alta rejeição era um problema para o Moro e é um problema para o Doria”, afirmou d’Avila ao Estadão. “A rejeição impõe um limite ao crescimento do candidato. E eles enfrentam a pressão dos pré-candidatos a deputado federal para abrir mão de suas candidaturas em razão dos recursos disponíveis do fundo eleitoral.”
Em carta, Presidente do PSDB defende resultado das préviasApós o governador de São Paulo, João Doria, anunciar que desistiria da pré-candidatura presidencial e ficaria no cargo, o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, enviou uma carta aos principais líderes do partido na qual defendeu o resultado das prévias pela primeira vez.
“Venho, por meio desta, reafirmar que o candidato a Presidente da República pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) é o governador do Estado de São Paulo, João Doria, escolhido democraticamente em prévias nacionais realizadas em novembro de 2021. As prévias serão respeitadas pelo partido”, escreveu Bruno Araújo, se dirigindo ao presidente estadual do PSDB, Marco Vinholi. “O governador tem a legenda para disputar a Presidência da República. E não há, nem haverá qualquer contestação à legitimidade da sua candidatura pelo partido. Aproveito a oportunidade para reafirmar o compromisso do PSDB com o processo democrático brasileiro.”
Ao longo da última semana, aliados de Doria se mobilizaram contra o que chamavam de tentativa de “golpe” contra sua pré-candidatura e cobravam do presidente nacional do PSDB um posicionamento contundente em defesa do resultado das prévias presidenciais tucanas realizadas no ano passado, em meio às movimentações de Eduardo Leite, que anunciou na segunda-feira que deixará o governo gaúcho e continuará no partido.
União Brasil condicionou filiação de Moro a recuo de candidatura ao PlanaltoBrasília e São Paulo (AE) – A condição de que o ex-juiz Sérgio Moro abrisse mão do plano de lançar uma candidatura presidencial foi determinante para que o União Brasil aceitasse sua filiação. Em nota pública divulgada ontem, momentos antes do comunicado em que Moro anunciou a saída do Podemos e a troca de legenda, o secretário-geral do União Brasil, ACM Neto, e outros seis integrantes do partido – todos oriundos do antigo DEM – rechaçaram a possibilidade de Moro disputar o Palácio do Planalto. O ex-ministro deverá concorrer a uma vaga na Câmara dos Deputados.
O texto é assinado pelo primeiro-secretário do partido, deputado Efraim Filho, pelo ex-senador Agripino Maia, pelo governador de Goiás, Ronaldo Caiado (vice-presidente), pela deputada Professora Dorinha, pelo ex-deputado Mendonça Filho e pelo prefeito de Salvador, Bruno Reis.
Moro chegou a ser apresentado como pré-candidato à Presidência quando se filiou ao Podemos, em novembro passado, mas enfrentava resistências no partido, sobretudo dos deputados, refratários a ceder parte do fundo eleitoral para a campanha ao Planalto. O ex-ministro da Justiça aparecia em terceiro lugar na disputa presidencial, com cerca de 8% das intenções de votos.
Nessa quinta, ao anunciar sua filiação ao União Brasil, Moro afirmou que abre mão, “neste momento”, da pré-candidatura à Presidência. Ao trocar de partido, ele também mudou o domicílio eleitoral, do Paraná para São Paulo. “Serei um soldado da democracia para recuperar o sonho de um Brasil melhor”, afirmou, em nota.
Moro disse que o Brasil “precisa de uma alternativa que livre o País dos extremos, da instabilidade e da radicalização”. “Por isso, aceitei o convite do presidente do União Brasil, Luciano Bivar, para me filiar ao partido e, assim, facilitar as negociações das forças políticas de centro democrático em busca de uma candidatura presidencial única”, declarou. “A troca de legenda foi comunicada à direção do Podemos, a quem agradeço todo o apoio. Para ingressar no novo partido, abro mão, neste momento, da pré-candidatura presidencial”.
‘Surpresa’A presidente do Podemos, Renata Abreu, no entanto, afirmou que a legenda foi informada pela imprensa sobre a troca de partido. “Para a surpresa de todos, tanto a Executiva Nacional quanto os parlamentares souberam via imprensa da nova filiação de Moro, sem sequer uma comunicação interna do ex-presidenciável”, diz a nota assinada pela deputada. O Estadão apurou que Moro falou ontem, por volta das 8h, com o senador Alvaro Dias (Podemos-PR), mas não citou mudança de partido.
O anúncio foi feito à tarde, após longa reunião com representantes do União Brasil em um hotel, em São Paulo. No início da tarde, ainda durante o encontro, o deputado Alexandre Leite (SP) se antecipou ao ex-juiz e publicou nota anunciando sua filiação.
A chegada de Moro ao União Brasil foi alinhada com o presidente da legenda, Luciano Bivar, da ala oriunda do PSL. Os dois jantaram juntos na segunda-feira e, na noite de anteontem, Bivar validou a ficha de filiação de Moro. Outro entusiasta do ex-juiz no partido é o também deputado Junior Bozzella (SP), também ex-PSL e aliado de Bivar.
Na nota divulgada pouco antes do anúncio do ex-juiz, integrantes da ala ligada a ACM Neto afirmam que entendem que Moro pode “contribuir muito para o debate político nacional”. “Entretanto, deixamos claro que seu eventual ingresso ao União Brasil não pode se dar na condição de pré-candidato à Presidência.”

Fonte: Tribuna do Norte

Foto: Daniel Teixeira/estadão conteúdo