A senadora Simone Tebet, pré-candidata do MDB à Presidência da República, disse que o partido tem compromisso com seu projeto de concorrer ao Palácio do Planalto. “É uma questão de sobrevivência para o MDB. A única forma de unir o partido é lançando candidatura própria”, afirmou.

A senadora destacou que o MDB “não vai esquecer o que o PT fez no verão passado”, mas admitiu diálogo com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com críticas mais duras a Jair Bolsonaro, Simone pregou a união da terceira via, em 2022, para tirar o presidente do segundo turno.

Simone não poupou, porém, o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro, que tem atraído antigos aliados de Bolsonaro e aparecido em algumas pesquisas com dois dígitos de intenção de voto. Nesta entrevista, Simone reconheceu erros do MDB e afirmou que a definição sobre as eleições de 2022 não será feita por caciques do partido, mas pela base nos municípios.

A seguir os principais trechos da entrevista disponibilizada pela Agência Estado:

O desafio maior da pré-campanha é convencer que a senhora não é candidata a vice?
O desafio maior é me tornar conhecida. Já deixei claro para o partido que não vou abrir mão das minhas convicções, independentemente de conquistar voto. Eu preciso falar para a política o que a mulher pensa. Está muito claro para o meu partido que eu não tenho plano B.

O MDB tem compromisso com sua candidatura até o final?
É uma questão de sobrevivência para o MDB. A única forma de unir o partido é lançando candidatura própria. A minha candidatura não foi almejada por mim, foi solicitada pelo partido e veio das bases. Os caciques comandam, mas eles jamais comandam em dissonância com o chão. A candidatura própria é para valer. Não é uma brincadeira.

Nas duas vezes em que a senhora disputou a presidência do Senado, o partido escolheu outros candidatos. A novela vai se repetir agora?
Na primeira vez, fui para uma disputa e perdi para um emedebista (Renan Calheiros), que, posso não gostar, mas tem história. Nessa última, quando entraram as emendas, o RP9 no processo, eu não fui só traída pelo MDB… Quantos colegas disseram que iam votar em mim e não votaram? Não posso imputar minha derrota ao MDB.

Como o partido vai lidar com palanques regionais que apoiem o presidente Jair Bolsonaro?
Agora é hora de colocar o bloco na rua. Essa é a largada, não é chegada, há uma longa caminhada pela frente. Essa unanimidade ninguém teve, nem Ulysses. Mas a unidade do partido vamos conquistar ao longo do caminho e vai passar pelo apoio popular. Na polarização não interessa para o MDB nem estar no palanque do Bolsonaro nem estar no palanque do Lula. Quem apoiar traz consigo a rejeição desses candidatos e eu não tenho rejeição.

O ex-presidente Michel Temer disse que a senhora seria uma boa vice de João Doria, do PSDB. É uma aliança possível?
O presidente Michel Temer, a quem respeito muito, não sabe como foi a construção da minha candidatura. Eu abri mão de um processo eleitoral de reeleição no Senado. Eu vim para ser candidata depois de muita conversa, diálogo com o partido e um processo de internalizar essa ideia. A partir disso, eu entrei de cabeça. Eu me coloquei como candidata e só tenho plano A. Espero que ninguém fale que eu possa ser uma boa vice pelo fato de eu ser mulher.

A articulação de caciques do MDB com o ex-presidente Lula não é uma tentativa de volta ao passado?
A política é a arte de dialogar, temos que dialogar com todos até para dizer não. Temos que dialogar para dizer que nós não concordamos que o Brasil volte àquele passado nebuloso com condutas erradas. O caos econômico que vivemos hoje não deixa de ser uma consequência de erros da gestão Dilma. É óbvio que passou de lá para um presidente menos capaz ainda e que, no momento da pandemia, abandonou o País à própria sorte. Não podemos esquecer o que o PT fez no verão passado, mas isso não impede de dialogar com quer que seja. O diálogo é a arte de procurar consenso.

Qual é a responsabilidade da terceira via diante de uma possibilidade concreta de segundo turno entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula?
Eu não cogito essa possibilidade. O centro democrático precisa oferecer para o país uma esperança. Não podemos depender de líder do passado, que desencantou boa parte da população brasileira pelo que deixou de fazer e pelos erros que cometeu. Mas, principalmente, temos que ter uma opção para o País que não seja o presente, o atual presidente.

A senhora coloca Bolsonaro e Lula na mesma régua? São dois extremos iguais?
A única coisa diferente é que um é democrata e o outro, não. Tenho que reconhecer que a esquerda hoje no Brasil é democrática, fez a transição e nunca ameaçou as instituições. Mas só nisso que eles diferem. Os dois não representam o que o Brasil precisa.

É possível uma candidatura única na terceira via ou esse grupo já está rachado?
Esse afunilamento vai se dar naturalmente. Não é uma conta de quem é melhor nas pesquisas. Você tem que fazer uma conta geral: quem é que tem condições de tirar Bolsonaro do segundo turno? Ninguém pode colocar essa possibilidade em risco.

O presidente do MDB, Baleia Rossi, falou contra “heróis fabricados”. O ex-ministro Sérgio Moro é um herói fabricado?
Não quero falar de outros candidatos, quero falar do perfil que é necessário para administrar o País. O Brasil não tem mais tempo para aventuras, para arriscar, e não pode mais entrar nessa onda de experimentação. A população sabe que não pode mais arriscar. Daí entendo que o candidato tem que mostrar experiência administrativa.

A terceira via não pode acabar caindo na armadilha de um “aventureiro”?
Eu acredito muito na coerência e na sensibilidade dos homens públicos do País. Todos sabemos da importância do momento que estamos vivendo. Ou colocamos o projeto de País na frente do projeto partidário ou vamos todos morrer abraçados, afogados.

Com quais partidos pretende conversar? Tem alguém vetado?
Vamos conversar com o centro democrático. Não existe diálogo quando o outro não quer escutar. Então, não vejo como dialogar com Bolsonaro porque é o único que eu entendo não ser um democrata nesse processo.

A senhora defendeu um programa de transferência de renda com porta de saída?
A última coisa que a população precisa é de um governo que muda o nome para se assenhorar de um programa que não é seu. O programa mata a fome, ajuda as pessoas e faz o dinheiro circular na economia local. Dinheiro tem e já está alocado. É possível trabalhar com os R$ 400, mas é preciso colocar 3 milhões de famílias que estão na fila. O espaço fiscal estamos criando agora, bem ou mal, com a PEC dos Precatórios. A inserção no mercado de trabalho é fundamental como porta de saída.

Qual é o efeito do Auxílio Brasil para o presidente em ano eleitoral?
Nulo. Ele teve que tirar 20 milhões de famílias que recebiam o auxílio emergencial. Embora falem que é um valor turbinado, foi corroído pela inflação. E inflação provocada pelo governo Bolsonaro. Toda vez que ele fala, cria uma instabilidade que retarda investimentos privados, o dólar aumenta, a inflação sobe e a população fica endividada. A crise tem nome e sobrenome: Jair Messias Bolsonaro.

Vai ser possível fazer campanha falando em austeridade fiscal e corte de gastos?
Sim. A população precisa entender que a bandeira da responsabilidade social não é da esquerda, é de qualquer um de nós, mas precisamos de segurança jurídica. Eu não sou a favor de trancar o cofre, eu sou a favor de reorganizar a receita em uma reforma tributária.

O teto de gastos foi a principal âncora fiscal do País e agora está sendo alterado. A regra precisa ser revista?
O teto precisa ser mantido enquanto tivermos gordura para queimar. Não posso falar em outra reforma trabalhista e previdenciária antes de fazer a reforma tributária e uma reforma administrativa, que não é essa que está aí. Não temos que acabar com a estabilidade do servidor público. O que temos de fazer é regulamentar a lei para avaliação periódica de desempenho.

O presidente do Senado também pré-candidato, se rendeu ao governo no fatiamento da PEC dos Precatórios?
Ele se rendeu a ele mesmo e ao Lira. O que estava em jogo ali é o recurso deste ano, abrir espaço fiscal para este ano e para o ano que vem. E nós sabemos o que é preciso pagar até o final do ano aqui de orçamento que não conhecemos. Para isso é que precisava de espaço fiscal.

É inevitável um festival de emendas entrando no jogo eleitoral agora?
A PEC dos Precatórios fatiada pode ser o fim da democracia representativa que nós conhecemos. É um semipresidencialismo implantado da pior forma possível. É o presidente ficar refém do Congresso Nacional, de um Centrão que coloca seus interesses paroquiais acima do País. Se continuar um parlamentar recebendo mais do que outro, esse Centrão todo volta em 2022.

A senhora disse que seu primeiro anúncio será para o Ministério do Planejamento. Se vencer a eleição, quem será esse ministro?
Eu sei o que quero de política pública. Quero agora pessoas que possam transformar a nossa ideia em prática e projetos possíveis. Tem que ser um planejamento que tenha metas e programas para serem concluídos agora, outros em 20 anos e outros em 30 anos. Quem faz isso não é o ministro da Economia. Depois dos projetos, aí entra o economista para dizer o que o Brasil suporta. Sou uma liberal moderada. Eu sou a favor de privatizações, mas tenho questionamentos em relação à Petrobras e não concordo com privatização de bancos públicos.

Fonte: Tribuna do Norte
Foto: Arquivo TN