Após uma reunião com o setor da carcinicultura, o Governo do Estado prometeu dispensar os criadores de camarão da cobrança pelo uso outorgado da água bruta, proposta que está sendo discutida pela administração estadual e que tem provocado insatisfação do setor produtivo do Rio Grande do Norte, além de críticas da classe política.

De acordo com o presidente da Associação Norte-Riograndense de Criadores de Camarão (ANCC), Orígenes Monte, a promessa foi feita durante uma reunião realizada na última terça-feira 6 no gabinete do secretário de Agricultura do RN Guilherme Saldanha. Também estavam presentes no encontro o secretário de Recursos Hídricos Paulo Varella, o presidente do Igarn Paulo Sidney, além de carcinicultores e assessores do governo.

“Está em tramitação com aprovação da câmara técnica a dispensa de outorga de água salgada e salobra. Essa dispensa chega a atingir 95% dos carcinicultores, então quer dizer que não vai haver cobrança de outorga da água. Esse problema ficou resolvido com a carcinicultura num percentual muito alto, porque a maioria não seria atingida por essa cobrança. Houve uma mudança de rumo do governo em relação à carcinicultura”, disse o presidente da ANCC ao AGORA RN nesta sexta-feira 9.

Em relação ao demais carcinicultores, que usam água doce ou de pouca salinidade na produção, também está em discussão uma possível dispensa da taxação. A expectativa é que até o final junho haja uma nova reunião com representantes do governo estadual para se tentar chegar a um entendimento entre as partes.

“Isso foi dito numa reunião essa semana pelos secretários de Agricultura, de Recursos Hídricos e pelo presidente do Igarn. Está em tramitação a formalização dessa dispensa. Não sei em que termos isso vai acontecer, mas foi garantido”, acrescentou Origenes Monte.

De acordo com o governo, a cobrança pelo uso da água bruta – definida como aquela sem tratamento, como de rios e mananciais – deverá ser efetivada com base na Lei n° 6.908, aprovada pela Assembleia Legislativa em 1996. A legislação, que deverá ser regulamentada pelo Executivo, dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos.

De acordo com o texto, a cobrança pelo direito do uso da água, superficial ou subterrânea, se dá como um instrumento gerencial e de planejamento da Política Estadual de Recursos Hídricos. A taxação, no entanto, não será aplicada a todos os setores. Deverão ficar isentos, por exemplo, os pequenos produtores e a agricultura familiar.

Apesar de ainda não haver prazo para o início da cobrança, os setores produtivos já se movimentam para que o Governo não dê prosseguimento à ideia. A classe econômica tem o apoio de agentes políticos, principalmente os que fazem oposição à gestão Fátima Bezerra (PT). O principal argumento deles é que a taxação irá onerar ainda mais a classe produtiva, que já sofre com a alta carga tributária.

O governo, por sua vez, diz que a cobrança da água bruta é importante para dar sustentabilidade financeira à gestão dos recursos hídricos estadual, além de incentivar o uso consciente da água e garantir segurança hídrica.

A previsão do governo, de acordo com o secretário Paulo Varella, é arrecadar R$ 10 milhões por ano, recursos que serão destinados a investimentos no próprio setor e na preservação das bacias hidrográficas.

Para o presidente da ANCC, porém, a cobrança não tem fundamento jurídico. Além disso, ele não considera a ressalva feita pelo governo aos carcinicultores como “isenção”. “Não há nenhum fundamento jurídico para ser cobrada outorga de água salgada/salobra, inclusive o Ceará não cobra. Na realidade nós não consideramos isenção, consideramos permanência de uma situação de não cobrança; isenção é quando você tem o direito de cobrar e não cobra, o que não vem a ser o caso, no nosso entendimento”, argumenta Origenes Monte.

Carcinicultura passa por momento de estabilidade no RN

O setor da carcinicultura passa por um momento de estabilidade no Rio Grande do Norte. Segundo maior produtor do crustáceo no Brasil, o Estado perdeu o posto de maior produtor para o Ceará. Apesar disso, o presidente da ANCC afirma que o setor vem passando por uma fase de regularidade.

“Em uma média podemos dizer que o setor da carcinicultura passa por um momento de estabilidade há alguns anos. O mercado tem conseguido se manter, a produção não tem aumentado em termos de quantidade de viveiros, mas tem aumentado a produção por metro quadrado”, explica Origenes.

Ele classifica a carcinicultura como um mercado “interessante” para a economia estadual e que também contribui com o desenvolvimento do turismo. “Nós esperamos que haja essa contribuição por parte do governo ou pelo menos que não se coloque dificuldade para o setor”, afirma o presidente da entidade sobre a dispensa da cobrança.

Nos anos de 2021 e 2022 as cidades que mais produzem camarão no RN registraram queda na produção e foram superadas por municípios cearenses. Cidades como Pendências, Canguaretama, Arez, Senador Georgino Avelino, Mossoró e Nísia Floresta são exemplos dessa redução na produtividade.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2021 a produção potiguar foi cerca de 12 mil toneladas menor que a cearense, apesar de o produto do Rio Grande do Norte ter mais valor agregado para exportação.

De acordo com o presidente da ANCC no RN, os produtores potiguares também se destacam pela legalização da atividade, o que não acontece no Ceará, segundo ele.

“O Rio Grande do Norte tem a maioria dos produtores de camarão legalizados ambientalmente e fiscalmente falando. Essa mentalidade hoje não é acompanhada pelos outros estados, que em sua maioria não são legalizados como nós somos aqui. Um assunto como esse de outorga de água bruta não afeta eles em nada, porque eles não estão preocupados com legalização”, afirma Origenes.

O presidente da associação também afirma que no Rio Grande do Norte o Ministério Público estadual e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) atuam de forma mais firme em suas atribuições institucionais quando se voltam para a carcinicultura potiguar.

“Nós temos no RN um Ministério Público que tem uma lente de aumento muito ampliada quando olha para a carcinicultura, temos uma fiscalização do Ibama que também tem uma lente de aumento com relação à nossa atividade; já tivemos aqui viveiro explodido pela fiscalização porque não era legalizado, tivemos uma senhora de mais de 70 anos presa porque não era legalizada e isso não acontece em outros estados”, reclama.

Fonte: AgoraRN

Foto: Reprodução